No mesmo país das Olimpíadas, Copa do Mundo, das igrejas evangélicas que pedem ofertas de R$900 reais prometendo uma vida blindada e próspera... homens, mulheres e crianças perderam o pouco que tinha, vítimas de uma sociedade que prioriza outras coisas que parecem ser mais importante:
Rodrigo Bertolotto
Do UOL Notícias
Em São Paulo
Do UOL Notícias
Em São Paulo
Dois rapazes trocam socos e rolam no meio da lama com cinza do incêndio dominical. Um minuto antes estavam batendo boca. "Eu não quero negociar nada com esses pilantras", disparou um. "Você me chamou do quê?", respondeu o outro, já peitando o vizinho. O pessoal do "deixa disso" se enlameou e sobraram pedaços de pau carbonizados na cabeça de alguns.
A polícia, montando guarda na frente de um conjunto habitacional em construção, via à distância o quebra-pau entre moradores que perderam tudo com o fogo que tragou 300 barracos e deixou 1.300 pessoas que viviam na favela Nova Jaguaré, zona oeste de São Paulo, desabrigadas no último domingo.
Os nervos ficaram acirrados nesta terça-feira (13). Quando os moradores voltaram ao local e viram um escavadeira derrubar as poucas paredes de alvenaria que ficaram em pé, alguns se revoltaram e jogaram pedras no veículo, abandonado então pelo motorista.
Depois foi a vez de nova tentativa de invasão do conjunto habitacional em construção. A ação foi barrada por um grupo de oito guardas municipais e três policiais militares. Os moradores já tinham, no feriado de segunda-feira, tomado o espaço para reivindicar a inclusão deles em planos habitacionais. Saíram seis horas depois com a promessa de cadastramento.
"Estamos há dois dias vivendo a leite azedo e bolacha, que nos dá a Defesa Civil. E a gente nem pode se inscrever na prefeitura porque nossos documentos também queimaram. Não podemos tirar novos porque temos que ficar aqui para cuidar de nosso espaço", afirma Vandrei Ferreira, operador de telemarketing que já dormiu em um clube vizinho e na casa de uma amiga nessas duas noites após o incêndio.
Negociador com os órgãos públicos, Elias Ferreira dos Santos, líder comunitário da Nova Jaguaré, tentava convencer os favelados a não tentar represálias até segunda-feira (19), dia em que a prefeitura se comprometeu a dar solução para os desabrigados. Diante de um coro de "vamos invadir a marginal", ele tentou acalmar os ânimos: "Nossa luta é por moradia, não adianta enfrentar a polícia."
Uma senhora não se contentou: "Você é um safado, eu vou me endividar no depósito de material, mas construo meu barraco de novo aqui." Elias cochichou para ela: "Na fechada, eu digo para você fazer isso. Nós prometemos que não vamos invadir o CDHU do lado, mas não prometemos que não iríamos reconstruir nossas casas."
Dos desalojados, 150 alegaram não ter um local para morar, e foram levados para o centro desportivo no bairro de Presidente Altino, onde permanecerão por cerca de 30 dias. Muitos se queixam das condições por lá. "O chão e os banheiros são sujos. Hoje, a única alimentação foi um biscoito cream cracker às 14h. Não tem um fogão para a gente cozinhar a cesta básica que recebemos no domingo", reclama o desempregado Luis da Silva.
Apartando briga e negociando com a polícia estava o garçom Joaquim Ribeiro da Silva, 70 anos de vida e 45 anos de Jaguaré. O barraco onde viviam suas duas filhas, um genro e cinco netos foi totalmente carbonizado. "Eles estão morando que nem cachorro, porque meu barraco está em pé, mas não cabe todo mundo. Cachorro vive melhor que a gente", desabafa.
Ele conta que seu neto de 15 anos acabou com queimaduras no braço para salvar um menino. "Minhas filhas não perderam muita coisa porque pobre que falar que tinha muito está mentindo. Foi uma TV, um fogão, um geladeira. Tudo velho. Mas era o cantinho deles", conta Joaquim.
CINZAS, LAMA E REVOLTA
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Máquina da Prefeitura derrubou as poucas paredes que ficaram em pé e foi alvo de pedradas
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Crianças e adultos se concentram em quadra de escola que está abrigando os desalojados
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Policias retiram os moradores que invadiram conjunto habitacional vizinho para protestar
Os nervos ficaram acirrados nesta terça-feira (13). Quando os moradores voltaram ao local e viram um escavadeira derrubar as poucas paredes de alvenaria que ficaram em pé, alguns se revoltaram e jogaram pedras no veículo, abandonado então pelo motorista.
Depois foi a vez de nova tentativa de invasão do conjunto habitacional em construção. A ação foi barrada por um grupo de oito guardas municipais e três policiais militares. Os moradores já tinham, no feriado de segunda-feira, tomado o espaço para reivindicar a inclusão deles em planos habitacionais. Saíram seis horas depois com a promessa de cadastramento.
"Estamos há dois dias vivendo a leite azedo e bolacha, que nos dá a Defesa Civil. E a gente nem pode se inscrever na prefeitura porque nossos documentos também queimaram. Não podemos tirar novos porque temos que ficar aqui para cuidar de nosso espaço", afirma Vandrei Ferreira, operador de telemarketing que já dormiu em um clube vizinho e na casa de uma amiga nessas duas noites após o incêndio.
Negociador com os órgãos públicos, Elias Ferreira dos Santos, líder comunitário da Nova Jaguaré, tentava convencer os favelados a não tentar represálias até segunda-feira (19), dia em que a prefeitura se comprometeu a dar solução para os desabrigados. Diante de um coro de "vamos invadir a marginal", ele tentou acalmar os ânimos: "Nossa luta é por moradia, não adianta enfrentar a polícia."
Uma senhora não se contentou: "Você é um safado, eu vou me endividar no depósito de material, mas construo meu barraco de novo aqui." Elias cochichou para ela: "Na fechada, eu digo para você fazer isso. Nós prometemos que não vamos invadir o CDHU do lado, mas não prometemos que não iríamos reconstruir nossas casas."
Dos desalojados, 150 alegaram não ter um local para morar, e foram levados para o centro desportivo no bairro de Presidente Altino, onde permanecerão por cerca de 30 dias. Muitos se queixam das condições por lá. "O chão e os banheiros são sujos. Hoje, a única alimentação foi um biscoito cream cracker às 14h. Não tem um fogão para a gente cozinhar a cesta básica que recebemos no domingo", reclama o desempregado Luis da Silva.
Apartando briga e negociando com a polícia estava o garçom Joaquim Ribeiro da Silva, 70 anos de vida e 45 anos de Jaguaré. O barraco onde viviam suas duas filhas, um genro e cinco netos foi totalmente carbonizado. "Eles estão morando que nem cachorro, porque meu barraco está em pé, mas não cabe todo mundo. Cachorro vive melhor que a gente", desabafa.
Ele conta que seu neto de 15 anos acabou com queimaduras no braço para salvar um menino. "Minhas filhas não perderam muita coisa porque pobre que falar que tinha muito está mentindo. Foi uma TV, um fogão, um geladeira. Tudo velho. Mas era o cantinho deles", conta Joaquim.
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