sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Lutamos contra a morte

Jung Mo Sung
(...) A CF deste ano deve ajudar as comunidades a tomarem mais consciência da materialidade da vida e da íntima relação entre essa dimensão e a salvação. A Bíblia, diferentemente da filosofia grega que divide o ser humano em corpo X alma, nos ensina que, na criação, Deus insuflou nas narinas do ser humano "um sopro de vida e o homem se tornou um ser vivente" (Gn 2,7). Nós somos seres viventes e como tais lutamos contra a morte. E a imagem de "sopro de vida" nos lembra que a vida é o dom mais precioso que recebemos de Deus, que a vida vem de "dentro" de Deus (nosso Deus é Deus da Vida) e que, como sopro, a vida é algo frágil que precisa ser continuamente cuidada e preservada. Por isso, a Bíblia continua a narrativa dizendo que Deus fez brotar da terra "toda espécie de árvore formosa para ver e boas de comer". A vida humana é para ser vivida na formosura, beleza, e com boa comida partilhada.
É pela mesma razão que Jesus disse que veio para que todos nós tenhamos vida e a tenhamos em abundância (cf. Jo 1010), assim como nós celebramos na eucaristia a memória de Jesus, que viveu e lutou para que a mesa compartilhada fosse uma realidade para toda a humanidade e, por isso, deixou o seu corpo como comida e o seu sangue como bebida. E na missa católica apresentamos, na oferta, "o pão que é fruto da terra e do trabalho do homem".
A vida humana depende do trabalho e da "natureza", depende também de como funciona a economia. E salvar a vida contra as forças da morte e contra as mentiras (8º. mandamento, na versão da Igreja Católica e 9º na versão das Igrejas protestante) e idolatrias que justificam essas mortes em nome de falsos deuses das (2º/3o. mandamento) é a missão do cristianismo e das igrejas.
Se perdermos de vista a dimensão material-econômica da vida, perdemos de vista o ser humano real e concreto e, assim, perdemos o núcleo da missão cristã e o que faz valer a pena sermos cristãos hoje, apesar de tudo. (No próximo artigo, o aspecto teológico-espiritual da economia).

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Marginalizados no mundo, centrais na Igreja


"Aqueles que são marginalizados no mundo são centrais na Igreja, e é assim que deve ser! Portanto nós somos chamados como membros da Igreja para continuar indo às margens da nossa sociedade. Os sem-teto, os famintos, os órfãos, pessoas com AIDS, nossos irmãos e irmãs perturbados emocionalmente - eles requerem nossa primeira atenção.

Podemos confiar que quando nós estendermos a mão com toda a nossa energia para as margens da nossa sociedade nós descobriremos que pequenas discordâncias, debates infrutíferos e rivalidades paralisantes irão gradualmente cessar e desaparecer.

A igreja será sempre renovada quando nossa atenção mudar de nós mesmos para aqueles que precisam do nosso cuidado. A bênção de Jesus sempre vêm a nós através do pobre. A experiência mais notável daqueles que trabalham com o pobre é que, no final, o pobre dá mais do que recebe. Eles nos dão comida..."

Henri Nouwen


terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Quanto custa para salvar uma vida?


Muitos de nós consideramos difícil doar dinheiro para pessoas que nunca vimos e de países distantes que nunca visitamos. Isso é ainda mais difícil durante períodos de incerteza econômica, quando muitas pessoas ficam ansiosas quanto às suas perspectivas econômicas. Embora este livro não tente depreciar os desafios que acompanham os momentos difíceis da economia, devemos lembrar que, mesmo na pior hora, nossas vidas continuam sendo melhores do que as daquelas pessoas que vivem em meio à pobreza extrema.
Quanto custa salvar uma vida? lança a esperança de que você veja o quadro geral e pense sobre o que é preciso para viver eticamente em um mundo no qual 18 milhões de pessoas morrem desnecessariamente a cada ano, uma taxa de mortalidade maior do que a da Segunda Guerra Mundial. Nos últimos 20 anos, somam-se mais mortes do que as causadas por todas as guerras civis e internacionais e pela repressão dos governos de todo o século XX - o século de Hitler e Stalin. O quanto daríamos para evitar aqueles horrores? Porém, não será muito pouco o que estamos fazendo para evitar o número de mortos ainda maior de hoje, e todo o sofrimento envolvido?
Se você ler este livro até o final e examinar com cuidado e sinceridade a situação global, concordará que é preciso que entremos em ação.

Site para adiquir o livro.

Filmes Save the Children “I WAS…”



Outros Filmes - Save The Children

Inferno em Darfur: 300 mil crianças morrem por ano no Sudão

domingo, 31 de janeiro de 2010

Pensar o ser humano depois de Auschwitz


Leonardo Boff *
Adital -


Recordamos neste ano os 65 anos do Holocausto de judeus perpetrado pelo nazismo de Hitler e de Himmler. É terrificante a inumanidade mostrada nos campos de extermínio, especialmente, em Auschwitz na Polônia. A questão chegou a abalar a fé de judeus e de cristãos que se perguntaram: como pensar Deus depois de Auschwitz? Até hoje, as respostas seja de Hans Jonas, do lado judeu; seja de J. B. Metz e de J. Moltmann, do lado cristão são insuficientes. A questão é ainda mais radical: Com pensar o ser humano depois de Auschwitz?
É certo que o inumando pertence ao humano. Mas quanto de inumanidade cabe dentro da humanidade? Houve um projeto concebido pensadamente e sem qualquer escrúpulo de redesenhar a humanidade. No comando devia estar a raça ariano-germânica, algumas seriam colocadas na segunda e na terceira categoria e outras, feitas escravas ou simplesmente exterminadas. Nas palavras de seu formulador, Himmler, em 4 de outubro de 1943: "Essa é uma página de fama de nossa história que se escreveu e que jamais se escreverá". O nacional-socialismo de Hitler tinha a clara consciência da inversão total dos valores. O que seria crime se transformou para ele em virtude e glória. Aqui se revelam traços do Apocalipse e do Anti-Cristo.

O livro mais perturbador que li em toda minha vida e que não acabo nunca de digerir se chama: "Comandante em Auschwitz: notas autobiográficas de Rudolf Höss" (1958). Durante os 10 meses em que ficou preso e interrogado pelas autoridades polonesas em Cracóvia, entre 1946-1947, e, finalmente, sentenciado à morte, Höss teve tempo de escrever com extrema exatidão e detalhes como enviou cerca de dois milhões de judeus às câmaras de gás. Ai se montou uma fábrica de produção diária de milhares de cadáveres que assustava aos próprios executores. Era a "banalidade da morte" de que falava Hannah Arendt.

Mas o que mais assusta é seu perfil humano. Não imaginemos que unia o extermínio em massa aos sentimentos de perversidade, sadismo diabólico e pura brutalidade. Ao contrário, era carinhoso com a mulher e filhos, consciencioso, amigo da natureza, enfim, um pequeno burguês normal. No final, antes de morrer, escreveu: "A opinião pública pode pensar que sou uma besta sedenta de sangue, um sádico perverso e um assassino de milhões. Mas ela nunca vai entender que esse comandante tinha um coração e que ele não era mau". Quanto mais inconsciente, mais perverso é o mal.

Eis o que é perturbador: como pode tanta inumanidade conviver com a humanidade? Não sei. Suspeito que aqui entra a força da ideologia e a total submissão ao chefe. A pessoa Höss se identificou com o comandante e o comandante com a pessoa. A pessoa era nazista no corpo e na alma e radicalmente fiel ao chefe. Recebeu a ordem do "Fuhrer" de exterminar os judeus, então não se deve sequer pensar: vamos exterminá-los (der Führer befiehl, wir folgen). Confessa que nunca se questionou porque "o chefe sempre tem razão". Uma leve dúvida era sentida como traição a Hitler.

Mas o mal também tem limites e Höss os sentiu em sua própria pele. Sempre resta algo de humanidade. Ele mesmo conta: duas crianças estavam mergulhadas em seu brinquedo. Sua mãe era empurrada para dentro da câmara de gás. As crianças foram forçadas a irem também. "O olhar suplicante da mãe pedindo misericórdia para aqueles inocentes" -comenta Höss-, nunca mais esquecerei". Fez um gesto brusco e os policiais os jogaram na câmara de gás. Mas confessa que muitos dos executores não aguentavam tanta inumanidade e se suicidavam. Ele ficava frio e cruel.

Estamos diante de um fundamentalismo extremo que se expressa por sistemas totalitários e de obediência cega, seja políticos, religiosos ou ideológicos. A consequência é a produção da morte dos outros.

Este risco nos cerca pois demo-nos hoje os meios de nos autodestruir, de desequilibrar o sistema Terra e de liquidar, em grande parte, a vida. Só potenciando o humano com aquilo que nos faz humanos como o amor e a compaixão podemos limitar a nossa inumanidade.

[Autor de Tempo de Transcendência: o ser humano como projeto infinito, Vozes (2009)].
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