sábado, 14 de maio de 2011

A ‘bomba atômica’ do Terceiro Mundo: imigração

Jung Mo Sung
Coord. Pós-Graduação em Ciências da Religião, Universidade Metodista de São Paulo
Adital

Presidente Obama está lançando uma campanha nos Estados Unidos em favor da reforma da lei da imigração. Ele pretende legalizar a presença de uma parcela de imigrantes ilegais no seu país. Enquanto isso, na Europa, o tema da imigração ilegal é tão central que eles estão rediscutindo o tratado que liberou a circulação de pessoas dentro da União Européia. Juntamente com o tema do meio ambiente e da economia global, que ainda não retomou o caminho do crescimento, o tema da imigração se tornou um dos grandes problemas do mundo.

Uns vinte anos atrás, Maryse Brisson, uma teóloga haitiana, membro do Departamento Ecumênico de Investigaciones (DEI), de Costa Rica, disse em um seminário interno de estudo do DEI que a imigração ilegal seria a "bomba atômica” do Terceiro Mundo contra o Primeiro. Vários acharam o comentário um pouco exagerado, mesmo reconhecendo que o tema era importante. Hoje, eu penso que a metáfora dela pode ter sido não muito precisa – afinal, bomba atômica tem um efeito imediato –, mas ela tinha razão!

É claro que não estou propondo aqui uma guerra contra os países ricos, nem uma leitura militar do problema, mas a imigração ilegal tem se tornado um dos temas sociais e políticos centrais nesses países. Os anti-imigrantes mais radicais poderiam pensar que, mais do que bomba atômica, a imigração ilegal, e até também legal em grande escala, está se tornando um câncer para sua "boa sociedade”.

Eu usei aqui o termo "anti-imigrantes”, e não xenófobos, porque penso que o problema não é com estrangeiros em geral, pois eles não têm nada contra turistas ocidentais ricos que visitam seus países ou com empresários asiáticos que vão fazer negócios, mas com certo tipo de estrangeiro, o pobre, com pele não-branca e de costumes e religiões estranhos que entram em seus países para trabalhar em serviços sujos, pesados e mal pagos. Há uma mistura de questões econômicas, étnicas e culturais nesta rejeição aos imigrantes (legais e ilegais) pobres que são transformados em bodes expiatórios sobre os quais se lança a culpabilidade de todos os problemas, medos e frustrações.

Por outro lado, emigração tem se tornado uma "saída” para muitos que vivem nos países pobres. Ninguém, ou quase ninguém se torna um imigrante por puro prazer de aventura. Aliás, eu sou também um imigrante, que saiu da Coréia do Sul, há mais de 40 anos para vir morar do outro lado do mundo, em uma terra estranha, de costumes, alimentos e idioma totalmente diferentes. Pessoas são pressionadas pelas circunstâncias da vida (guerras, crise econômica, perseguições políticas ou religiosas, etc) a se tornarem imigrantes em uma terra estranha.

O problema é que não há solução rápida ou imediata. Os países ricos necessitam de trabalhadores que façam serviços pesados, sujos e muito mal pagos que os seus próprios não querem fazer. Ao mesmo tempo, muitos trabalhadores dos países pobres não encontram outra saída para desemprego e fome senão a emigração. É uma situação estrutural. Porém, a vida social não é feita só de economia, mas também das dimensões culturais e psico-sociais. E o aumento do número de pessoas de costumes estranhos, para não falar de costumes considerados bárbaros (vale a pena ler "O medo dos bárbaros”, de Todorov), aumenta a insegurança da população dos países ricos pressionada pela crise econômica e pela perda dos valores e características que constituíam a sua identidade coletiva. Está montada uma situação propícia para o "mecanismo de bode expiatório”.

A sedução do mecanismo do bode expiatório (neste assunto René Girard é leitura essencial) consiste na culpabilização da vítima (imigrante pobre) de problemas (crise na vida social) que ela não é culpada. Na medida em que toda a "boa parte” da sociedade se une neste processo, cria-se uma falsa sensação do retorno a segurança, ordem e paz. Assim se comprovaria que a vítima deste mecanismo sacrificial era realmente culpada.

A defesa da inocência das vítimas é uma questão da verdade e da justiça, mas também é uma característica fundamental do cristianismo. A tradição cristã nasce da afirmação de que Jesus, que foi condenado e morto pela religião e Império, é inocente; e a prova desta inocência é que Deus o ressuscitou. É claro que há muitos aspectos difíceis de serem resolvidos neste grande problema da imigração em escala global, mas há uma contribuição que o cristianismo deve assumir como uma tarefa que tem a ver com a sua própria "essência”: a crítica ao mecanismo sacrificial do bode expiatório contra os imigrantes, legais e ilegais, e a defesa de que imigrantes são vítimas. E que a solução, portanto, não virá desse mecanismo mas de uma reestruturação profunda na forma como se articula a globalização econômica e relações políticas e sociais entre os países.

[Autor, com Hugo Assmann, de "Deus em nós: o reinado que acontece no amor solidário aos pobres”. No twitter: @jungmosung]

sexta-feira, 13 de maio de 2011

Inseridas e entrelaçadas

Ora, qual pessoa provida de entendimento irá considerar admissível a declaração de que o primeiro, o segundo e o terceiro dia, nos quais são mencionados tanto tarde quanto manhã, tenham existido sem sol, lua e estrelas – o primeiro dia até mesmo sem um céu? E quem se mostrará ignorante o bastante para supor que Deus, como se fosse um lavrador, tenha plantado árvores no paraíso, no Éden no leste, e nela uma árvore da vida – isto é, uma árvore de madeira visível e palpável, da qual quem comesse com dentes físicos obteria vida, e se comesse também da outra árvore, adquiriria o conhecimento do bem e do mal? Não creio que alguém duvidará de que a declaração de que Deus caminhava ao entardecer no paraíso, e que Adão tenha se escondido debaixo de uma árvore, estejam narrados figurativamente na Escritura, e que algum significado místico esteja sendo indicado por ela. O afastamento de Caim da presença do Senhor irá manifestamente levar o leitor atento a ponderar sobre o que é a presença de Deus, e de que forma alguém pode afastar-se dela. Porém, sem estendermo-nos além dos devidos limites na tarefa que temos diante de nós, será muito fácil, para quem quiser, distinguir na Escritura sagrada aquilo que está registrado como tendo de fato acontecido, mas que no entanto não se pode crer tenha ocorrido de modo racional e concebível da forma como foi historicamente narrado.

O mesmo estilo de narrativa escritural ocorre abundantemente nos evangelhos, como quando se diz que o diabo levou Jesus a uma montanha muito alta, a fim de mostrar-lhe dali todos os reinos do mundo e a glória deles. Como poderia ter literalmente acontecido, quer que Jesus se deixasse levar pelo diabo a uma montanha muito alta, quer que o diabo pudesse mostrar a ele todos os reinos do mundo (como se jazessem todos debaixo de seus olhos mortais, e adjacentes à montanha), isto é, os reinos dos persas, dos citas e dos hindus? Como poderia ter-lhe mostrado os modos pelos quais os reis desses reinos recebem glória dos homens? E tantas outras instâncias similares a esta se podem encontrar nos evangelhos por qualquer um disposto a lê-los com atenção, que notará que nas narrativas que parecem ter sido ser literalmente registradas estão inseridas e entrelaçadas coisas que não podem ser admitidas historicamente, mas podem ser aceitas num sentido espiritual.

Orígenes de Alexandria (185-254 d.C.), em De Prinicipiis (livro IV)

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Simulacros


Elienai Cabral Junior

O que pensamos, do que temos medo, o que amamos, nossas crenças não podem evidenciar-se. Não totalmente, menos ainda de uma vez por todas. É preciso negociar o que de nós pode participar da vida pública e o que deve permanecer guardado como reserva existencial.

É possível existir verdade demais em uma alma para que ela se exponha e com isso comprometa sua sobrevivência. É preciso economizar as exibições.

O contrário é também verdadeiro. Neste jogo ambivalente, muito pouca verdade em uma alma, ou uma verdade que faz seu portador pequeno demais, reivindica grandes mentiras em um desempenho.

Verdade demais ou de menos, mas todos têm algo a escamotear. A isso chamamos de interioridade.

Aquela mulher tem envolvimentos questionáveis. Todos já sabem e ninguém toca no assunto. Não convém ir às últimas conseqüências. Talvez porque lhes sejam muito bons seus favores sexuais, ou muito útil sua candidatura iminente a próxima maldita. Ela segue sua rotina de culpa e apreensão. Qualquer dia desses o seu mundo desmorona.

Jesus faz escolhas sintomáticas. Sensível demais com quem ninguém se importa. Gente já assentada nos espaços organizados para que a vida de todos prossiga sem perturbação. Mulheres, doentes, pecadores, malditos, por eles demonstra afetos perigosos. Sua linguagem o classifica entre revolucionários. Fala de um Reino para pobres e incita à busca de justiça. Mas o que é mais grave, parece ficar à vontade demais com os proscritos, demonstra com eles sentir-se em casa. Veja como olha para essa gente. Veja como bebe, come e ri. Entre os demais mestres há uma intuição desesperada de que ele é uma ameaça, de que suas intenções são profanas. De que esconde o que a todos escandalizaria.

Fariseus e mestres da Lei, estes despendem enorme energia no jogo. Dos três, Jesus, a mulher e os guardiões da religião, estes são os mais miseráveis. Todos padecem, mas ninguém precisa tanto esconder quanto eles. Ninguém lustra com tanto rigor e piedade o que aos outros aparece. Jesus anda revoltado com o seu procedimento. Já os chamou de “sepulcros caiados”, hipócritas.

E o trágico acontece. A mulher foi flagrada. O que pode ser mais proibido no jogo da moral que se deixar flagrar? Surpreendida em condições indisfarçáveis, seu sexo condenável de tão ardente, ou seria, ardente de tão condenável, acende escrúpulos e ardis. Como são perspicazes os escandalizados. O que mais desnudaria o perigoso mestre nazareno que a nudez de uma pecadora? Pois castrar o erótico é o que mais se aproxima de reprimir a crítica.

Jesus está cercado de gente quando o ruído raivoso interrompe seus ensinamentos. Homens de passos decididos, olhares fulminantes e um trapo humano nas mãos. Na boca, o rigor da lei; já no chão, a vergonha que despiu de humanidade a mulher; em seus corações, armadilhas.

O texto frio da lei é fluente no simulacro da moral. A letra grafada e morta não vasculha corações nem pergunta por afetos, não ilumina interioridades nem chora misérias, mata. Pronuncia-se a Lei com reverência, apedreja-se pessoas, portanto, com fervor. A lei diz para apedrejar e você, o que diz? Quem está ali conclui rápido a derrocada incontornável do mestre. Não dá para driblar a tensão. E todos já sabem que escolha ele fará.

Sua resposta é uma sátira. Um deboche. Uma charge. Porque todo assunto muito sério é uma piada. Jesus curva-se em desdém à gravidade da proposição e escreve com o dedo no chão. Galhofa. Sua escrita evade o ambiente e ri da austeridade dos zeladores da moral.

Neste instante há uma superposição de cenas. Fariseus e mestres da dura escrita da Lei com cenhos franzidos, pedras nas mãos e um jogo de poder funesto na alma, encena o primeiro plano. Ausentando-se para o segundo plano, Jesus, de cócoras, lúdico, escrevendo com o dedo no chão. Sua escrita brinca e dança na areia. Insuperável escolha. Quem olha não os tem no mesmo foco. Se o rigor oportuno dos fariseus é o que amamos, a imagem satírica de Jesus embaça, quase desaparece. Se a cena despretensiosa e estética do mestre, que rabisca desenvolto no chão, é o que nos magnetiza, então os aflitos e tensos fariseus esvanecem ao fundo. O Cristo que risca trivialidades no chão faz poesia e chama de triste ficção o flagrante que mente a vida e anuncia a morte.

Mas doutrinadores entendem de emboscadas morais e tocaias linguísticas, não de escritas leves e despretensiosas. A mesma poesia que salva Jesus da sanha por doutrina e dominação é desespero para os demais. Ah, se ele pudesse ficar ao chão, rabiscando, descolado daquele mundo, desligado daquela lógica! Eles insistem na inquisição e na morte da mulher. Cristo se ergue, dedos sujos de tanto que brincou no chão, às inquirições questiona, pergunta às interrogações e flagra os flagrantes. Quem não tiver pecado atire a primeira pedra. Quem não se flagrar em segredos leve a sério a sua religião. Descobrir-se protagonista da grande piada é a pior vergonha. Um a um, todos se retiram.

Enquanto isso, Jesus mantém-se curvado e entregue aos rabiscos na areia. É assim que se escreve, com a fluidez de quem o faz sem a pretensão poderosa de se perpetuar. O resto é doutrina, é lei, é flagrante de morte. Ele dá as costas à escrita pretensiosa de ocupar o mundo, como se o mundo fosse o que aparece. Escreve no fugidio pó o traço da misericórdia. A escrita na areia que o vento leva é tão livre que torna aquele ambiente insustentável para os rígidos escribas. Apenas quem escreve conteúdos para serem esquecidos está apto a desenhar o belo e a liberdade. Apenas os riscos poéticos, espalhados no chão e que logo serão lançados pelo vento no imponderável horizonte, somente eles libertam os pecadores de seus cruéis flagrantes.

Não há mais ninguém ali, além dos dois. Estão livres, por enquanto. A mulher, do apedrejamento. Jesus, de mais uma arapuca. Mas os fariseus e mestres da lei, estes foram condenados a manterem a todo custo o falso brilho de sua aparência.

A mulher volta à vida. Jesus fica um pouco mais por ali, escrevendo na areia e saboreando, com um breve riso nos lábios, a sobrevida.

Até que em um dia desses, sua poesia se torne um crime e sua liberdade, uma cruz.


terça-feira, 10 de maio de 2011

Os valores do Reino

Villy Fomin

Com frequência Jesus foi interrogado sobre a proposta do Reino. Os homens queriam entender a ótica do Cristo.

“Eu porem vos digo”. Resposta muita utilizada por Ele. Uma nova maneira de entender a vida e de se relacionar com pessoas e com Deus.  As pessoas são a prioridade nesse Reino.

Jesus quebrou idéias e derrubou conceitos, abriu mão da companhia dos grandes e sentou-se com ladrões e prostitutas.

Jesus não reduziu o evangelho a uma mensagem para depois da morte, convidou todos para uma nova postura, convocou homens e mulheres a viverem de maneira que o Pai fosse glorificado.

Depois de uma boa conversa, Zaqueu entendeu essa dinâmica, parou de roubar e entrou no maravilhoso processo de salvação.

Os valores de Jesus são os mais lindos e nobres, sempre que uma pessoa absorve essas idéias Cristo nasce e novas possibilidades surgem pintando o horizonte de esperança.

“Valores não se dizem, se vivem. São testemunhados em gestos exemplares, vivido e sofridos. São eles que convencem e fascinam”.
Leonardo Boff 

Acredito que o Reino começou, em nós, entre nós. Os valores do Cristo estão disponíveis, firmes nesses valores poderemos construir um lindo futuro.

segunda-feira, 9 de maio de 2011

Osama e Obama



Frei Betto
Escritor e assessor de movimentos sociais
Adital

Estranho que a CIA, ao declarar que assassinou Osama Bin Laden, não tenha exibido o corpo, como fez à sobeja com outro "troféu de caça”: Ernesto Che Guevara.

Bin Laden saiu da vida para entrar na história. Até aí, nada de novo. A história, da qual poucos têm memória, está repleta de bandidos e terroristas, cujos nomes e feitos quase ninguém lembra. Os mais conhecidos são o rei Herodes; Torquemada, o grande inquisidor; a rainha Vitória, a maior traficante de drogas de todos os tempos, que promoveu, na China, a Guerra do Ópio; Hitler; o presidente Truman, que atirou bombas atômicas sobre as populações de Hiroshima e Nagasaki; e Stálin.

O perigo é que Osama passe da história ao mito e, de mito, a mártir. Sua morte não deveria merecer mais do que uma nota nas páginas interiores dos jornais. No entanto, como os EUA são um país necrófilo, que se nutre de vítimas de suas guerras, Obama transforma Osama num ícone do mal, atiçando o imaginário de todos aqueles que, por alguma razão, odeiam o imperialismo estadunidense.

Saddam Hussein, marionete da Casa Branca manipulada contra a revolução islâmica do Irã, demonstrou que o feitiço se volta contra o feiticeiro.

Desde 1979, Osama Bin Laden tornou-se o braço armado da CIA contra a ocupação soviética no Afeganistão. A CIA ensinou-o a fabricar explosivos e realizar ataques terroristas, movimentar sua fortuna através de empresas-fantasmas e paraísos fiscais, operar códigos secretos e infiltrar agentes e comandos.

"Bin Laden é produto dos serviços americanos”, afirmou o escritor suíço Richard Labévière. Derrubado o Muro de Berlim, desde 1990 Bin Laden passou a apontar seu arsenal terrorista para o coração de Tio Sam.

O terrorismo é execrável, ainda que praticado pela esquerda, pois todo terrorismo só beneficia um lado: a extrema direita. Na vida se colhe o que se planta. Isso vale para as dimensões pessoal e social. Se os EUA são hoje atacados de forma tão violenta é porque, de alguma forma, eles se valeram do seu poder para humilhar povos e etnias. Há décadas abusam de seu poder, como é o caso da ocupação de Porto Rico; a base naval de Guantánamo encravada em Cuba; as guerras ao Iraque e Afeganistão e, agora, à Líbia; a participação nas guerras da Europa Central; a omissão diante dos conflitos e das ditaduras árabes e africanas.

Já era tempo de os EUA, como mediadores, terem induzido árabes e israelenses a chegarem a um acordo de paz. Tudo isso foi sendo protelado, em nome da hegemonia de Tio Sam no planeta. De repente, o ódio irrompeu da forma brutal, mostrando que o inimigo age, também, fora de toda ética, com a única diferença de que ele não dispõe de fóruns internacionais para legitimar sua ação criminosa, como é o caso da conivência da ONU com os genocídios praticados pela Casa Branca.

Quem conhece a história da América Latina sabe muito bem como os EUA, nos últimos 100 anos, interferiram diretamente na soberania de nossos países, disseminando o terror. Maurice Bishop foi assassinado pelos boinas verdes em Granada; os sandinistas foram derrubados pelo terrorismo desencadeado por Reagan; os cubanos continuam bloqueados desde 1961, sem direito a relações normais com os demais países do mundo, e uma parte de seu território, Guantánamo, continua invadida pelo Pentágono.

Nas décadas de 1960 e 70, ditaduras foram instauradas no Brasil, na Argentina, no Chile, no Uruguai, na Bolívia, na Guatemala e em El Salvador, com o patrocínio da CIA e sob a orientação de Henry Kissinger.

Violência atrai violência, dizia dom Helder Camara. O terrorismo não leva a nada, exceto a endurecer a direita e suprimir a democracia, levando os poderosos à convicção de que o povo é incapaz de governar-se por si mesmo.

Vítimas inocentes não podem ser sacrificadas para satisfazer a ganância de governos imperiais que se julgam donos do mundo e pretendem repartir o planeta como se fossem fatias de um apetitoso bolo. Os atentados de 11 de setembro de 2001 demonstraram que não há ciência ou tecnologia capaz de proteger pessoas ou nações. Inútil os EUA gastarem trilhões de dólares em esquemas sofisticados de defesa. Melhor seria que essa fortuna fosse aplicada na paz mundial, que só irromperá no dia em que ela for filha da justiça.

A queda do Muro de Berlim pôs fim ao conflito Leste-Oeste. Resta agora derrubar a muralha da desigualdade entre Norte-Sul. Sem que o pão seja nosso, nem o Pai e nem paz serão nossos.

domingo, 8 de maio de 2011

A barbárie e a estupidez jornalística

Elaine Tavares
Jornalista
Adital
 
Imaginem vocês se um pequeno operativo do exército cubano entrasse em Miami e atacasse a casa onde vive Posada Carriles, o terrorista responsável pela explosão de várias bombas em hotéis cubanos e pela derrubada de um avião que matou 73 pessoas. Imagine que esse operativo assassinasse o tal terrorista em terras estadunidenses. Que lhes parece que aconteceria? O mundo inteiro se levantaria em uníssono condenado o ataque. Haveria especialistas em direito internacional alegando que um país não pode adentrar com um grupo de militares em outro país livre, que isso se configura em quebra da soberania, ou ato de guerra. Possivelmente Cuba seria retaliada e com certeza, invadida por tropas estadunidenses por ter cometido o crime de invasão. Seria um escândalo internacional e os jornalistas de todo mundo anunciariam a notícia como um crime bárbaro e sem justificativa.

Mas, como foi os Estados Unidos que entrou no Paquistão, isso parece coisa muito natural. Nenhuma palavra sobre quebra de soberania, sobre invasão ilegal, sobre o absurdo de um assassinato. Pelo que se sabe, até mesmo os mais sanguinários carrascos nazistas foram julgados. Osama não. Foi assassinato e o Prêmio Nobel da Paz inaugurou mais uma novidade: o crime de vingança agora é legal. Pressuposto perigoso demais nestes tempos em que os EUA são a polícia do mundo.

Agora imagine mais uma coisa insólita. O governo elege um inimigo número um, caça esse inimigo por uma década, faz dele a própria imagem do demônio, evitando dizer, é claro, que foi um demônio criado pelo próprio serviço secreto estadunidense. Aí, um belo dia, seus soldados aguerridos encontram esse homem, com toda a sede de vingança que lhes foi incutida. E esses soldados matam o "demônio”. Então, por respeito, eles realizam todos os preceitos da religião do "demônio”. Lavam o corpo, enrolam em um lençol branco e o jogam no mar. Ora, se era Osama o próprio mal encarnado, porque raios os soldados iriam respeitar sua religião? Que história mais sem pé e sem cabeça.

E, tendo encontrado o inimigo mais procurado, nenhuma foto do corpo? Nenhum vestígio? Ah, sim, um exame de DNA, feito pelos agentes da CIA. Bueno, acredite quem quiser.

O mais vexatório nisso tudo é ouvir os jornalistas de todo mundo repetindo a notícia sem que qualquer prova concreta seja apresentada. Acreditar na declaração de agentes da CIA é coisa muito pueril. Seria ingênuo se não se soubesse da profunda submissão e colonialismo do jornalismo mundial.

Olha, eu sei lá, mas o que vi ontem na televisão chegou às raias do absurdo. Sendo verdade ou mentira o que aconteceu, ambas as coisas são absolutamente impensáveis num mundo em que imperam o tal do "estado de direito”. Não há mais limites para o império. Definitivamente são tempos sombrios. E pelo que se vê, voltamos ao tempo do farwest, só que agora, o céu é o limite. Pelo menos para o império. Darth Vader é fichinha!
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