Ermanno Allegri
Diretor da ADITAL
Adital
Durante a Jornada Teológica da Região Norte, realizada de 5 a 8 de outubro, na Cidade do México com a participação de representantes da Teologia da Libertação, especialmente mexicanos e hispânicos dos Estados Unidos e Canadá, Adital conversou com Enrique Dussel, filósofo, teólogo e professor da Universidade Nacional Autônoma do México – UNAM. Na oportunidade, foram abordados temas como a Teologia da Libertação e os novos pensamentos que merecem a atenção na produção teológica, a onda de manifestações desencadeada pelos indignados da Espanha e pelos estudantes chilenos, e o livro El Pensamiento Filosófico Latinoamericano, del Caribe y ‘Latino': de 1300 y hasta 2000.
Confira a entrevista.
ADITAL: Atualmente, que fatos e que pensamentos novos merecem a atenção na produção teológica, sobretudo no que se refere à Teologia da Libertação e as teologias que dela nasceram?
Enrique Dussel: Alguns creem que a Teologia da Libertação acabou porque foi muito criticada dentro das igrejas, especialmente pela Católica, pelo Vaticano. Muitos bispos foram nomeados para condenar essa Teologia. Porém, o que acontece é que essa Teologia da Libertação, primeiro, foi a única nascida na América latina e que responde à nossa realidade, de maneira que qualquer pessoa que queira estudar teologia, quando lê as obras teológicas europeias entende que é uma teologia dogmática, abstrata e crê que isso é a teologia. Porém, quando lê a Teologia da Libertação Latino-americana, percebe que é uma teologia ligada à nossa realidade e que está explicando as contradições de nossa cultura. É uma diferença abismal. Por isso, é a única latino-americana e tem sido muito perseguida; porém, necessariamente, terá que ressurgir, e as teologias do futuro terão que referir-se a ela. Além disso, como mencionaste, há muitas teologias novas: a teologia indígena, a teologia afro-americana, a teologia feminista. Porém, todas são como um prolongamento da Teologia da Libertação. Esta foi uma teologia fundamental, que deveria ter sido desenvolvida diferencialmente e isso é o que está acontecendo. Isto é, que a teologia feminista é uma teologia da libertação e assim as demais. Vejo isso muito presente. Agora, deveríamos exigir que os jovens, as novas gerações, instrumentem com categorias filosóficas, sociológicas, antropológicas, psicanalíticas as mais importantes, as mais críticas e as mais atuais; e pensem a teologia a partir disso, e não simplesmente que pensem a teologia a partir de si mesma; mesmo a partir somente da Teologia da Libertação, pois, torna-se repetitiva. A Teologia da Libertação foi a fé cristã de pessoas que sabiam teologia; porém, incluía ciências sociais e tinha uma prática com as pessoas; ao falar de teologia, propunha novos temas e novas soluções. E, por isso mesmo, era tão original. E é isso o que está faltando agora: voltar a essa originalidade, porque muitos já repetem a Teologia da Libertação e esse não é o tema, ou, claro, fazem um comentário às obras europeias (mesmo as progressistas); porém, estão muito longe da Teologia da Libertação. Inclusive, a teologia Política europeia não é o que necessitamos.
ADITAL: Vivemos uma mudança de época e há valores que estão perdendo vigência para dar espaço a novos valores. Quais enfoques a Teologia da Libertação e o trabalho que fazemos como cristãos devem ser desenvolvidos para construir a nova história?
ED: O movimento de libertação surgiu de todos os movimentos que aconteceram no final dos anos 60 e, politicamente, foi a Revolução Cubana a que mobilizou a estrutura da política latino-americana, porque era uma revolução muito temida pelos Estados Unidos e que fez com que todo o campo político se movimentasse, culminando nos movimentos de 1968, que não se reduziu ao movimento estudantil, em Paris ou em Berlim; mas, aconteceu no México, em Tlatelolco; na Argentina, com o Cordobazo; e na América Latina o ano de 68 teve muita importância; porém, também foi um momento teórico porque houve uma nova Filosofia, sobretudo com a Escola de Frankfurt, através da qual se começou a conhecer Franz Borgan. Então, foi um movimento de grande criatividade teórica, criatividade prática, compromisso dos cristãos nos movimentos políticos. Era necessário dar uma nova explicação de como comprometer-se. Muitos, com a atração do marxismo, perdiam sua fé ou então tinham que dar uma nova explicação para que a fé continuasse funcionando como geradora da política e não se perdesse no compromisso. A Teologia da Libertação conseguiu isso; fez com que toda uma geração de jovens não só não perdessem sua fé, mas que fossem a vanguarda em um processo de mudança na América Latina e que culminou com a revolução Sandinista, que foi levada quase por cristãos. No Chile, o mesmo, a presença de cristãos; e daí em diante, sempre a presença de cristãos, pois já sabiam como lidar com mudanças históricas com a Teologia Renovada. Para os grupos conservadores, para as estruturas mais hierárquicas da Igreja, isso era muito crítico e não o aceitaram. Assim, após o Grande Concílio, que abriu as portas (na realidade, o Concílio Vaticano II, como não se interessava muito pelo Direito Canônico, nem pelas instituições vaticanas, porque não lhe davam importância, pois não as mudou), essas instituições romanas e esse Direito Canônico retomaram o poder na Igreja e o profetismo do Concílio começou a ficar para trás, como está hoje; e, claro, tudo isso gera uma mudança completa.
Porém, de todas as maneiras, hoje, é necessário voltar à Teologia a partir do horizonte dos novos pensadores; é necessário perceber quem são os grandes filósofos, sociólogos que podem dar-nos, à Teologia, uma nova visão; e, ao mesmo tempo, o sistema capitalista, especialmente o sistema financeiro, está em uma crise espantosa. Porém, ao mesmo tempo, começa a fazer algo que nunca fez na história do liberalismo e do capitalismo: explorar ao Estado Nacional; isto é, o capital financeiro que são os bancos e a bolsa está acostumando-se a fazer negócios com os Estados. Os capitalistas roubam seu dinheiro, guardam seu dinheiro nos bancos, declaram-se em quebra e pedem para ser resgatados pelo Estado e esse é um negócio fantástico e os Estados até agora não sabem como funciona o sistema e os estão ajudando para que o sistema bancário não entre em bancarrota. Porém, chegará o dia em que o sistema bancário terá que ser nacionalizado e se acabar toda a propriedade privada do capital financeiro porque está estafando aos Estados e isso faz com que os povos comecem a insurgir-se. Aí estão as comoções na Grécia e o Movimento dos Indignados nos faz pensar que estamos em 1968.
É uma grande oportunidade para uma grande Teologia e também estamos vivendo uma mudança de época fundamental.
ADITAL: Nesse momento de mudança de época, houve um acontecimento fundamental para a história da filosofia: foi lançado, aqui no México, o livro El Pensamiento Filosófico Latinoamericano, del Caribe y ‘Latino': de 1300 y hasta 2000. Você, Enrique Dussel, com Eduardo mendieta e Carmen Bohórquez aticularam essa obra, um volume de mais de mil páginas. Pode explicar o sentido novedoso e revolucionário dessa obra?
ED: Claro! Penso que essa obra é a culminação de um processo de um século que começa em 1910, com a Revolução Mexicana e começar a pensar muito rápido se há ou não há e como deve haver uma Filosofia Latino-americana, com Francisco Romero, na Argentina; com Leopoldo Zea, no México e grandes autores que estudaram a história do pensamento filosófico; porém, não falaram propriamente de uma filosofia latino-americana que propusesse perguntas e que respondesse de uma maneira original de tal forma que se colocasse dentro da discussão filosófica mundial com uma postura distinta. Creio que a primeira filosofia que faz isso explicitamente é a Filosofia da Libertação. Que não é somente uma História da Filosofia Latino-americana, mas uma Filosofia que tem consciência de ser distinta da europeia e da americana e tem perguntas distintas, respostas distintas e metodologia distinta. Agora, esse movimento original de Filosofia da Libertação necessita reconstruir a história dessa opção que diz "temos que pensar desde a América latina; porém, temos que pensar desde os oprimidos/as da América Latina”.
Essa não seria a perspectiva da maioria dos filósofos; mas, da minoria. Por isso é que essa obra, em certo sentido, é uma negociação política com todas as correntes filosóficas, onde autores prestigiados das distintas correntes (e são 18 correntes) fizeram parte dessa obra, que não é uma História da Filosofia Latino-americana a partir da Filosofia da Libertação.
É algo prévio; é uma primeira visão de conjunto. Porém, o fato de que um estudante possa ter essa obra em suas mãos e tomar conhecimento de todos os grandes filósofos latino-americanos com certas perguntas novas já é um fato original de uma nova época. Por isso é que é o fim de um processo de tomada de consciência e daqui em diante surgirão muitas outras Histórias da Filosofia. Porém, terão que referir-se a essa como ponto de partida, porque foi a primeira. E tem muita originalidade: é a primeira que considera a filosofia dos grandes sábios das grandes culturas originárias. Por isso, colocamos uma data simbólica: 1300. Poderia ter sido 800, porque há sábios; porém, em 1300 já há pensadores indígenas, com biografia, com data de nascimento e morte; obras conhecidas em códices... Então, já podemos falar deles. Também, queríamos romper com 1492. Então, são 700 anos de Filosofia na América Latina. E, claro, incluímos ao Caribe, porque é parte da América Latina e a parte Latina nos Estados Unidos; são 50 milhões de habitantes e têm um pensamento filosófico. O consideramos latino-americano; então, é forte.
O século XVI é o começo da filosofia moderna da Europa.
Da Europa que ‘conquista' a América Latina e o Caribe e se perguntam: ‘podemos fazer isso? Temos o direito? Eles são homens; são pessoas humanas? E os europeus fazem essas perguntas até a modernidade e dizem: "o indígena é um ser humano se segunda categoria e, portanto, temos direito a beneficiá-lo com a conquista”.
Todavia esse é o pensamento da Filosofia Europeia e Americana hoje, porque continuam pensando que a África, a América Latina são subdesenvolvidos, subumanos. Veja como tratam aos latino-americanos nos Estados Unidos; são gente de segunda... E não percebem.
Quando vou aos Estados Unidos a um congresso sobre Descartes, que é o primeiro filósofo moderno (falo como eurocêntrico), recordo que Descartes estudou em um colégio jesuíta e quando tinha 13 anos estudou o curso de Lógica. A Lógica é a parte mais estrutural, abstrata e metódica da Filosofia; e estudou a Lógica de Antonio Rubio, que era um filósofo mexicano que escreveu um comentário de Aristóteles, conhecida como a Lógica Mexicana.
Descartes estudou Lógica a partir de um filósofo mexicano. Como isso é possível? Porque havia um século de filosofia antes de Descartes já era filosofia séria, mundial; porque os jesuítas que publicavam essas Lógicas estavam na África, na Índia, no Japão e conheciam todo o mundo periférico e, além disso, estavam de Estocolmo até a Itália e conheciam o mundo. Então, houve uma Filosofia no Século XVI que a modernidade ocultou; porém, que, nós, latino-americanos, devemos ressuscitar, porque é nossa primeira etapa, como filosofia europeia, não somente como filosofia latino-americana. Colocar o século XVI não como o início dos estudos latino-americanos, mas como o primeiro capítulo da Filosofia Moderna será uma batalha difícil; porém, é o que nossa obra começa a fazer.
Então, não é folclórica, nem latino-americana. É uma filosofia com sentido mundial que começou na América Latina; porém, agora ganha uma dimensão importante no diálogo intercultural com a África e a Ásia.
ADITAL – As Jornadas Teológicas Norte podem marcar uma nova reflexão teológica e uma nova ação no trabalho social (é a caridade) das Igrejas e em sua presença no mundo? Devemos recordar que nestas Jornadas o enfoque ecumênico tem sido fundamental.
ED: Sim, e por isso me parece que essas atitudes são importantes e que sejam ecumênicas, pois diante desse enlameado da cúpula eclesial católica – que desde o Vaticano não pensa para nada em uma originalidade prática e pastoral do povo Latino-Americano, asiático e africano e porque estamos vivendo um papado completamente eurocêntrico -, o ecumênico dá muito mais liberdade e permite planejar outros temas. É importante tomar consciência de que é necessário o que eu dizia em um encontro em Cuba há anos, que devemos criar a segunda Teologia da Libertação. E, qual é a diferença desta segunda com a primeira? Eu marco 16 diferenças: epistemológicas, temáticas... Muitas coisas novas têm surgido. Não é assunto de comentar o que se fez há 40 anos; tem que fazer tudo de novo, mas com a mesma hipótese.
ADITAL: O senhor escreveu isso em algum livro ou artigo?
ED: Existe um artigo meu em uma reunião de Matanzas: ‘A nova Teologia da Libertação e a diferença com a dos anos 60'; porque os autores que tratavam nos ´60s não são os autores (filósofos, sociólogos, politicólogos) que se usam no XXI. Então eu, pessoalmente, estou muito atento ao pensamento político e filosófico contemporâneo até a última obra do ano passado. Então, posso pensar uma Teologia a partir disso. Agora não sou professor de Teologia; ninguém me chama a fazer; seria perigoso. Sou filósofo, mas se me pedem para fazer Teologia, sou teólogo; se me pedem para fazer História, sou historiador. Não conheço bem essas disciplinas por profissão, estou fazendo Filosofia por modus vivendi. Mas esta Filosofia é como a epistemologia da Teologia da Libertação para entender a história da Teologia Latino-Americana. O que fiz em um livrinho que se chama ‘História da Teologia da Libertação', que também mostra as mesmas etapas e como se foi fazendo porque houve uma Teologia da Libertação no século XVI crítica da conquista, uma Teologia da Libertação da Emancipação em crítica à Espanha e Portugal e justificando a emancipação e a nossa é de certa maneira a Terceira Teologia da Libertação, a deste processo de emancipação colonial de nosso país a respeito de EUA e Europa. Agora, o nosso inimigo EUA, é a Metrópole e tem que se livrar dele. No século XIX foram Espanha e Portugal e no começo foi a crítica da conquista que foi a expansão europeia. Então, tem que ter uma visão histórico-mundial para poder não receber objeções de algum lugar.
ADITAL: Praticamente escreveram uma História da Igreja
ED: É interessante, escrevemos a história da Igreja, a primeira. Tiramos a história dos conservadores; nunca os progressistas e revolucionários escrevem a história. Nós progressistas e revolucionários escrevemos a primeira história em 10 tomos, tomamos o lugar dos conservadores. Agora eles fazem história desde Espanha, as pessoas do Opus Dei... Bem, é uma história anedótica, desta que aborrece. A nossa era dar aos atores da história a compreensão do que estavam fazendo. Tiramos-lhes a história; tiramos-lhes a tradição; porque a elevamos. É um processo sério e que tem muito futuro.
ADITAL: O senhor afirmou que é necessário considerar a história sempre em uma visão mundial. Hoje, os ‘indignados' da Grécia, Espanha, Wall Street...; os estudantes no Chile; as mobilizações dos países árabes questionam o modelo capitalista da sociedade. Quais os denominadores comuns nessas mobilizações que são de libertação?
ED: O movimento na realidade começou entre os árabes, no Egito. Assim, que não começou nos indignados da Espanha; é um fato, é um efeito da crise do capitalismo. O capitalismo, por sua tecnologia, cria um desemprego estrutural e o desemprego não pode se solucionar nunca mais, porque há, que o diga Marx, população de sobra. Mas, não há população de sobra; há um sistema que nos fala que não pode absorver a população, que não diminui a jornada de trabalho, uma quantidade de coisas que se cria um gargalo da garrafa onde a contradição e a contradição é que tem uma desocupação estrutural, especialmente entre os jovens que são os que não entram no sistema. E é por isso que desta vez não são os operários, como pensava Marx, nem são os camponeses, como pensava Mao... De pronto são os jovens, porque são os que não têm mais entrada no sistema, estão fora do sistema; e todo o sistema de poder, em 50 anos, de pleno emprego, de aposentadorias, de segurança social que um capitalismo crescente pôde oferecer, se acabou. Agora, na realidade, as pessoas não vão se aposentar mais; vão trocar de trabalho, o que não está mal; o velho trabalhará de outra maneira. Não vejo para quê deixar de trabalhar; mas que trabalhe um trabalho que um velho possa fazer; mas tem que trabalhar muito menos, quatro ou cinco horas por dia e então em seguida todo o mundo estaria trabalhando; ganhará menos porque terá menos necessidades: não tem que trocar de carro a cada ano, mas sim a cada 30 anos porque os carros serão bons. E não vou trocar de roupa todos os dias... Eu tenho estes sapatos que comprei em Chicado em 1989, há mais de 20 anos e eu digo: a fábrica de sapatos já se haverá dissolvido porque são tão bons que não vendem mais sapatos; mas esses são bons. E então a humanidade necessita de muito menos coisas para aumentar a qualidade de vida: a redução das necessidades supérfluas e o aumento das necessidades qualitativas. Para isso a economia pode se reduzir muitíssimo e não há necessidade da moda e então a eletrônica vai entrar a ser um grande instrumento. Estamos no fim de uma época nestes anos para uma nova modernidade. É uma nova época da humanidade, mais além da modernidade. Vai ser um novo sistema ecológico, humano, com outros critérios do que começou no século XVI. A questão é grave e estamos vendo essa efervescência da vida; mas os jovens já não poderão ser sistema.
ADITAL: Os indignados estão fazendo história...
ED: Eu tiro agora um livrinho: "Cartas aos Indignados” (*) e vou publicar aqui no México e vou te enviar no Brasil. É uma Carta aos Indignados; um tratadinho de 60 páginas, político; e digo aos indignados: vocês podem estar um tempo nas praças; mas, no fim, vão tem que voltar às casas. Mas, o que tem que fazer é mudar o sistema político. Tem que criar um sistema participativo, representativo e então criar todas as instituições nas quais o povo possa exigir a representação e fiscalizar. É um novo sentido para a democracia. A democracia, na realidade, nunca foi participativa; a norte-americana foi apenas representativa. Tem que fazer uma revolução política para que os indignados deixem de estar nas praças e estejam nas instituições políticas, como povo, vigiando. E então isso vai ser o fim do capital financeiro e vai ser a participação do povo para a melhor vida de todos e não de uma elite. Então vem uma grande revolução que mesmo Marx não havia previsto, porque ele a pensava econômica. Mas a revolução é política, porque quando o povo tomar o poder de verdade, institucionalmente, o sistema econômico vai mudar; mas como fruto da decisão política. Então, estamos em um momento político e eu estou elaborando uma Filosofia Política e sai uma Teologia Política. De um tratado que nunca a Teologia tratou, o Tratado de Estado como construtor do Reino de Deus.
ADITAL: Realmente esta questão é nova e deve ser debatida. Como o senhor a entende?
ED: A Igreja é uma instituição do Reino de Deus; mas o Estado é tão construtor do Reino de Deus quanto a Igreja. Ela divide o pão porque existe fome, bom. Mas dar de comer ao faminto o faz o Estado; é seu papel político. A igreja recorda que tem de dar de comer, claro. Nunca, até hoje, se tem feito uma Teologia do Estado porque está posto a Teologia e o Estado, duas coisas: o Estado é o secular e a Igreja o espiritual. Falso: o Estado constrói o Reino de Deus e não é secular; é uma instituição construtora do reino de Deus. Não é eclesial; mas o que passa é que a religiosidade se identifica com o secular e o fetichismo também. Entra na Igreja e entra no Estado: é uma nova teologia. É a próxima Teologia da Libertação...
ADITAL: É difícil pensar nesse Estado de que o senhor fala porque estamos acostumados a outros tipos de Estados…
ED: Sim, mas também é difícil falar de Igreja porque estamos acostumados a outros tipos de Igreja. Olhe a igreja burocrática, gerontocrática, machista, dogmática: é uma miséria. Jesus era um homem jovem e esta é de puro velhos, machos... Onde está a mulher?..., as mulheres... Onde estão as mulheres?... Não tem nenhuma compreensão. Então, que igreja... Está cheia de pecado. Bom, o Estado também. Assim como se fetichiza a igreja, se fetichiza o Estado. Nenhuma instituição é perfeita. São instrumentos nas mãos de Deus; são os Messias proféticos ou Messias reais, os que dão vida às instituições. Mas sem a profecia, burocratiza-se a Igreja. Mas, sem a instituição, a profecia também desaparece, porque não há escola de profetas, não há tradição. E onde está a nova geração? Então é uma instituição profética que às vezes é mais instituição e se fetichiza...; e às vezes mais profecia e aí cumpre. O mesmo no Estado. O Estado por aí é mais representativo e domina; mas quando for mais participativo vai ser um Estado messiânico e então tem de pensar na santidade do político e disso não se tem feito nada. Fala-se de fé e política como que eu me comprometo em algo obscuro, difícil, secular que não tem a ver com o reino de Deus. Então me pediram para fazer um curso agora ‘fé e política'. Não sabes o que vou fazer!... Porque vou falar de santidade, de compromisso político construtor do reino de Deus. Agora isso o dizia, por exemplo, La Pira, um grande democrata cristão que foi prefeito de Florência, na Itália; era santo depois da Segunda Guerra Mundial, democrata, cristão, evangélico que lutava pelas pessoas e pelos pobres. Era um grande político. Depois, seu partido foi burocratizado e a democracia que tinham ficou na direita e defende o capital. Merkel não tem nada a ver com Adenahuer e os atuais democratas cristãos, todos corrompidos com a droga e com a máfia... Mas um Adenahuer era um tipo que havia lutado contra Mussolini e era um grande político cristão. Mas, esses sim, tinham o carisma político tanto quanto um bispo ou um cura; mas trabalhavam em outra institucionalidade. A mística da política tem que voltar.
(*) O autor prometeu enviar a Adital cópia desse material e, após recebermos, publicaremos.
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