quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Paraisópolis x Morumbi


Bairros cresceram juntos, um fornece mão-de-obra, o outro opressão

Márcio Zonta
de São Paulo (SP)

“Essa humilhação constante no trabalho, aliada à própria violência simbólica que a riqueza desmedida provoca na população da favela, transforma a relação entre os dois pólos numa bomba-relógio”. Essa é a análise do sociólogo da Universidade de São Paulo (SP) Tiaraju D’Andrea, autor da dissertação de mestrado Nas Tramas da Segregação: o Real Panorama da Pólis, sobre a relação entre Paraisópolis e o bairro de classe econômica alta do Morumbi.

Em sua pesquisa para o mestrado, ele constatou que 25% da população de Paraisópolis está desempregada e os outros 75% trabalham no setor informal; a maioria no entorno rico, servindo como mão-de-obra barata, prestando serviços de babás, empregadas domésticas, zeladores, motoristas e pedreiros com baixa remuneração e alta exploração.

O sociólogo revela que esses trabalhadores não usufruem as conquistas da classe trabalhadora, já que, “não possuem nenhum tipo de benefício como carteira assinada, férias, ou 13º”.

A população da comunidade de Paraisópolis serve a eles para que realizem os serviços braçais, diz o sociólogo. “Pensar que o Morumbi apresenta ofertas de emprego ao Paraisópolis é uma análise rasa. Afinal quem precisa de quem no final das contas? A elite do Morumbi não realiza nenhum desses trabalhos e necessita dessa população pobre para realizá-los. E quanto maior for a oferta mais explorados eles serão”, enfatiza.

Fora daqui

Segundo Tiaraju, pode-se afirmar que Morumbi e Paraisópolis crescem imbricados por uma necessidade mútua, “impulsionada a partir da década de 1960, pelo crescimento do bairro rico. Paraisópolis se constitui como sendo o abrigo dos trabalhadores da construção civil contratados para edificar as mansões e condomínios do Morumbi e para trabalhar nas obras viárias e de infra-estrutura urbana que passaram a ocorrer na região nessa época”, revela.

Por que não se oferecem à comunidade, com tanta riqueza ao redor, meios de vida dignos, já que as principais demandas são por educação, saneamento básico, moradia e trabalho. José Maria, Líder da União do Movimento em Defesa das Moradias e Melhoras da Comunidade de Paraisópolis, tem a resposta ao seu modo: “Eles querem acabar com a favela, nos tirar do meio dos ricos”.

A menos de 30 metros de uma das entradas que dá aceso a Paraisópolis, num comércio da avenida Giovanni Gronchi, um morador de um suntuoso prédio da região faz jus às palavras de Zé Maria. “Adorei essa Operação Saturação, esses caras pensam que são quem, para quebrar tudo, não são ninguém, tem que tomar bala mesmo”, afirmou.

Esse pensamento opressor explicita o modo de vida na região. “Existe toda uma gama de situações que induzem à revolta local: o trabalhador explorado, o jovem miserável e sem perspectiva, o desemprego em massa, a tortura da polícia denunciada pela população local, a opressão simbólica expressa pelas mansões e condomínios do entorno, a falta de moradia digna, de saneamento básico, de serviços públicos, dentre outros fatores que transformam o morar em favelas em uma humilhação cotidiana”, conclui Tiaraju.

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