sábado, 26 de setembro de 2009

O cupim e suas plataformas


A humanidade parece um cupim muito grande, onde trabalham milhões de formigas, cada uma no seu lugar, conforme um plano que nenhuma delas inventou, mas que mantém o cupim do jeito que ele está, incapaz de mudar. Em cima, moram umas formigas bonitas numa vida bastante atarefada, mas rendosa. Possuem tudo de que precisam. Elas moram na plataforma mais alta do cupim, mas não sabem que é plataforma. Acham que o piso de sua casa é o chão mesmo. Embaixo desta plataforma, há muitas outras plataformas ou andares. As de baixo, dos porões, sustentam as de cima. Não se sabe bem quantas plataformas existem no cupim, mas são muitas. todas as formigas ou quase todas, acham que o piso da sua plataforma é o chão, e o seu forro, o telhado. Não olham muito além do seu andar. Identificam-no como o cupim todo.

Existe uma comunicação entre as várias plataformas, mas é de formigas individuais. Elas sobem e descem, motivadas pelos interesses das que moram na sua plataforma, interesses de comércio, de parentesco, de religião, ou de política. Elas estranham o modo diferente de viver nas outras plataformas, mas não chegam a questionar a existência das plataformas em si. Nem lhes passa pela cabeça a possibilidade de uma mudança. Pois do jeito que as coisas são feitas, as formigas estão presas na plataforma onde nasceram. Elas mesmas, com os seus corpos, formam as colunas que sustentam a plataforma superior. São sobretudo os pais, os adultos, que sustentam este peso. Eles não podem sair, porque a sua saída faria desabar tudo e mataria os filhos. O amor aos filhos é a força que mantém as formigas no lugar onde estão.


Há porém algumas que estão começando a perceber que tudo isso pode ser mudado e que não é necessário haver estas plataformas todas. Mas nem todas reagem da mesma maneira. Umas, ao perceber que tudo isso pode ser mudado e que não é necessário haver estas plataformas todas. Mas nem todas reagem da mesma maneira. Umas, ao perceberem a possibilidade de mudança, ficam apavoradas com a visão de um futuro diferente e desconhecido, tanto asssim que já começaram a estabelecer uma rígida fiscalização para que ninguém mude nada no cupim. Outras, porém, trabalham junto às formigas das plataformas inferiores, para que acordem e parem de sustentar esta situação. Tanto as que lutam a favor da mudança como as que são contra, quase todas elas moram nas plataformas de cima e lutam entre si pelo poder sobre a consciência das de baixo. A maioria, porém, que vive nas plataformas inferiores, não sabe nada disso. Vive hoje, como viveram os pais, e não percebem que as plataformas estão aumentando para cima e para baixo, formando uma verdadeira pirâmide, cuja base se forma cada vez mais larga e cuja ponta está ficando cada vez mais fina. Todas elas são prisioneiras da situação em que nasceram e vivem.


Acontece muitas vezes que algumas formigas isoladas de plataforma mais baixa se desprendem da sua coluna e comecam a viajar. Chegam, por vezes, até à plataforma mais alta. Lá são bem recebidas, recebem comida, comida boa e diferente. São acolhidas até para servir como objeto de estudo. Curiosidades de uma outra civilização, de um outro mundo! As formigas de baixo gostam disso e, quando voltam para sua plataforma, contam mil maravilhas do que viram, colocando água na boca de todo mundo. Levam objetos de cima para baixo: fotografias de revistas, que são coladas nas paredes, como se fossem quadros bonitos; enfeites, vestidos, sapatos, rádios, vitrolas e muitas outras coisas. Usam estas coisas lá embaixo, onde, na realidade, são como maçã que nasce em laranjeira. Contentes e felizes, vivem o resto da vida cantando as belezas da grandeza do cupim!
Carlos Mesters - Seis Dias nos Porões da Humanidade

2 comentários:

Francine disse...

Bem interessate o texto e o conteúdo de seu blog...
Parabéns!
Ah, convido-o a visitar meu blog...
http://francine-scardua.blogspot.com/
Até mais!

Helen Araújo disse...

Adorei o texto, de vdd!
Bju

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